O último livro que li ainda em 2017 não foi uma leitura fácil. Ofereceram-mo no Natal do ano em que a minha mãe faleceu, e tendo em conta que é um livro que fala essencialmente sobre a dor de perder um filho, processos de luto, e histórias da associação A Nossa Âncora, eu demorei 3 anos a ter coragem de o tirar da estante e enfrentar a leitura dum tema tão delicado.
O livro não é condescendente, nem mascara a dor profunda que as pessoas que generosamente partilharam a sua história sentiram e sentem diariamente. São relatos dolorosos e eu andei com lágrimas nos olhos muitas vezes. No entanto podemos também ver esperança, modos de lidar com a dor, processos de luto que um dia levam finalmente à aceitação, se bem que nunca ao esquecimento.
O maior mérito que esta narrativa teve para mim, que não tenho sequer filhos, foi ensinar-me aquilo que posso dizer ou fazer para ajudar uma pessoa nessa situação. Que é muito pouco, mas passa essencialmente por ouvir e fugir dos clichés e frases feitas de quem não faz ideia do que o outro está a passar, mas pode sempre oferecer um ombro ou um ouvido.
Algures no livro dizia-se que era importante para estes pais perceberem que o seu filho não tinha sido esquecido pelo resto do mundo, e mesmo pela família, que de algum modo teve impacto na vida dos outros. E isso tocou-me profundamente e fez-me pensar no colega de escola que faleceu de acidente de mota quando era adolescente, e do qual me lembro de vez em quando e das conversas que tínhamos em Sete Rios a comer castanhas assadas.
Outra coisa impressionante é que nos anos 90 morriam mais de 4000 jovens até aos 29 anos por ano, e em 2012 esse número tinha descido para pouco mais de 800. Para terem uma ideia passámos de cerca de 13 por dia a menos de 3, o que mostra uma evolução incrível na prevenção rodoviária e na mortalidade infantil.
Infelizmente a associação A Nossa Âncora foi extinta ainda no decurso da escrita do livro, mas com certeza que terá deixado os seus frutos e existirão hoje outros grupos de ajuda para pais nesta situação
Normalmente recomendo a leitura dos livros a quase toda a gente, mas este é especial, porque é difícil. Recomendo a quem tenha passado por uma perda semelhante, a quem seja familiar ou amigo, ou a quem queira aprender mais sobre a associação e as suas histórias de coragem. Mas vão avisados que são precisos lenços de papel.
Boas leituras!