Livros que Recomendo – American Gods

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Depois de quase dois anos a ler/reler as aventuras do Sandman, nada como vir aqui recomendar um dos meus livros favoritos deste autor. Imaginem toda a imagética delicada e refinada do senhor dos sonhos, mas traduzida para um livro de ficção. O resultado é uma história envolvente, cativante, e que nos deixa a pensar em todas as possibilidades que o nosso mundo ainda pode ter encerradas por trás das aparências.

Em American Gods, Neil Gaiman conta-nos a história de Shadow, um homem que acabou de sair da prisão em circunstâncias não muito felizes, e que vai arranjar um emprego como ajudante dum homem misterioso chamado Mr. Wednesday. Com ele vai viajar um pouco por toda a América contactando estranhas personagens e vivendo aventuras no mínimo duvidosas, que vão não só pôr em perigo a sua integridade física, como levá-lo a fazer descobertas interessantes sobre a sua própria identidade.

Mas esta é apenas a camada superficial da história que está depois envolta em inúmeras sub-histórias que são tão ou mais interessantes que a principal e que nos dão a conhecer deuses mitológicos do folclore mundial, mas também deuses recém-criados pelas nossas obsessões modernas. É mesmo a luta entre estas duas identidades que em última análise vai selar o destino do nosso personagem e que é uma analogia à nossa própria luta interior entre submetermo-nos a tradições ou abraçar o futuro sem reservas.

No final de tudo, e não surpreendentemente, o livre arbítrio sai vencedor, mas não sem antes nos levar numa jornada alucinante por batalhas épicas e viagens intensas cheias de personagens fascinantes. O meu favorito, Mr. Nancy, deu origem mais tarde a um livro em nome próprio, Anansy Boys, que também gostei muito, mas que falarei mais tarde.

Entretanto o livro foi adaptado para uma série televisiva que estreou em 2017 algures num canal americano, mas que eu não tive oportunidade de ver, e acerca da qual estou apenas medianamente curiosa, porque não sou grande fã de séries. Tendem a prolongar-se até ao infinito e a perder um pouco da magia da palavra escrita. No entanto, acho que me cruzarei com esta um dia.

Até lá recomendo este livro a todos os fãs de fantasia, de histórias bem contadas com um travo a antiguidade, mitologia, e sabedoria ancestral. Neil Gaiman é não só um excelente contador de histórias como é dotado dum profundo conhecimento de mitologia e história de arte, o que enriquece imensamente a sua prosa. Aconselho vivamente.

Boas leituras!

O Último Sandman

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Um dos livros que tinha para ler neste início de 2018 era este “The Wake“, para terminar a minha maratona de ler todos os livros do Sandman, escritos por Neil Gaiman. No penúltimo volume o rei do mundo dos sonhos tinha morrido na sua forma de Morfeu, e tinha deixado a sua essência numa jóia que entregou ao seu sucessor. Que continua a ser o senhor dos sonhos, mas já não é Morfeu. É um Endless, mas reinventado. Confuso? Percebe-se melhor lendo.

A primeira parte do livro, e na minha opinião a melhor, mostra-nos o velório e o funeral, os seus preparativos, convidados, discursos. Mais do que mostrar transporta-nos até lá, porque toda a humanidade está presente em sonhos. E do modo como está escrito, sentimo-nos mesmo presentes em todos os momentos, até deixarmos de estar convidados.

Continuamos depois por mais duas histórias com o novo Sandman, mas que não impressionam, principalmente a do ancião chinês que por causa da fonte utilizada me custou imenso ler.

E terminamos o livro voltando a Shakespeare, o grande amor quer de Sandman, quer de Neil Gaiman, a fechar o círculo com mais uma das suas peças, neste caso a última, como não podia deixar de ser. Recordo aqui que já “Sonho de uma noite de Verão” era presença assídua nestes contos, com as suas referências ao mundo das fadas e as suas personagens, e diz-se aqui que a peça foi uma encomenda de Morfeu para os seus amigos deste reino.

Ler estes livros foi como recordar o início da minha própria história, quando ouvia Bauhaus, ia à Juke Box e a minha estética de alguma forma se cruzava com a do senhor dos sonhos que na altura era a novidade que todos falavam e eu lia nas estantes da Fnac sonhando um dia comprar.
Entretanto crescemos os dois, mas o nosso caminho vai-se cruzando periodicamente nas fantasias que Neil Gaiman continua a escrever. Recomendo a todos aqueles que gostam de uma boa história pejada de mitos e sonhos, aos que acreditam que é impossível matar os sonhos e as boas ideias.

Goodreads Review

Boas leituras!

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Livros para 2018

Livros

Agora que está a começar o novo ano, e que como sempre tenho uma meta ambiciosa no Goodreads, venho aqui partilhar os livros que tenho planeados para ler de seguida. São vários, de temas e proveniências diversas, e devem manter-me entretida por bastante tempo. Como sempre, a probabilidade que apareçam alguns novos pelo meio para me desviar destas minhas boas intenções é altissima, e isso explica o facto de alguns destes livros apareçam recorrentemente nas minhas listas de boas intenções. Mas, ainda assim, aqui vai.

Planisfério Pessoal, de Gonçalo Cadilhe – Foi um livro que comprei quando fui à Festa do Livro em Belém mas ainda não tive oportunidade de começar. Às vezes o facto de no kindle ser tão fácil começar livros novos, não deixa tanto espaço para os livros em papel, mas este ano decidi que vou rectificar isso. Ou pelo menos, tentar. Este será com certeza um bom motivo.

The Golden House, de Salman Rushdie – Um dos livros que requisitei no Netgalley, já o comecei, mas entretanto outros se puseram de permeio e nunca mais tive ânimo para pegar neste. Mas as primeiras páginas pareceram-me interessantes o suficiente para voltar à história.

The Wake, de Neil Gaiman – Este ano tenho, obviamente, de ler o último volume das histórias do Senhor dos Sonhos, mesmo que seja penoso ou que se anteveja uma narrativa um pouco mais triste. Será o culminar de toda uma saga que acabou por me acompanhar quase dois anos e que encheu a minha vida de cor e realidades paralelas.

Endymion e The Rise of Endymion, de Dan Simmons – tenho de acabar a saga que comecei com Hyperion e Fall of Hyperion e que foi da melhor ficção científica que li nos últimos anos, se não mesmo de sempre. O facto destes 2 últimos volumes terem uma classificação ligeiramente menor tem-me feito adiar a leitura, já que tenho medo de manchar a imagem de quase perfeição que os outros me deixaram, mas tendo em conta que as pessoas a quem aconselhei o Hyperion continuaram alegremente a saga anima-me também a continuar.

Os Cus de Judas e As Naus, de António Lobo Antunes – Este é um autor que tenho muita dificuldade em ler, tenho mesmo uma embirração particular. Mas resolvi trazer estes dois livros de casa do meu pai para ver se 2018 é finalmente o ano em que se quebra o feitiço ou desisto de vez.

Dentro da Noute: Contos Góticos – Uma antologia de contos góticos portugueses e brasileiros, organizada por Ricardo Lourenço e que está disponível no Projecto Adamastor aqui.

Estes 8 livros, em teoria, já me dariam para os primeiros meses do ano. Mas cheira-me que vou andar entretida mais tempo, até porque com brinquedo novo há sempre coisas diferentes para experimentar.

Boas leituras!

O Penúltimo Sandman

Sandman 9

Estamos quase no fim do ano, e eu que pensava que teria despachado todo o Sandman em 2017 vejo essa profecia a não se concretizar. E uma das razões para isso não acontecer, é que depois de ter lido o volume anterior, fabuloso, de ter visto o cortejo fúnebre final, e sabendo que o próximo volume se chama “The Wake“, já não seria surpresa o que iria ocorrer neste livro. E Neil Gaiman sabe disso, e trata-o com a mestria de excelente contador de histórias que é, levando-nos pela mão num crescendo de ansiedade, semelhante ao que eu senti quando li “Crónica de Uma Morte Anunciada” de Gabriel García Márquez. E por isso eu li devagar. Muito devagar, prolongando o mais que podia a vida do senhor dos Sonhos, como se disso dependesse a minha própria vida nocturna.

Todo o tom ominoso do livro está muito bem conseguido, e o ar arrogante com que o Senhor dos Sonhos vai sucessivamente ignorando todos os avisos com que se cruza tornam-no exasperante. Mas na realidade, como sempre, há mais coisas a ocorrer do que aquelas que nos são mostradas na superfície, e o desespero gótico com que Morpheus encara a vida tem um papel tão importante na trama como os acontecimentos que se desenrolam.

É, como sempre, um excelente livro, se bem que por vezes sinto que se tivesse um conhecimento mais profundo de mitologia (grega, nórdica, etc), conseguiria desfrutar melhor das referências que vão sendo apresentadas ao longo da história. A minha fraca memória também não ajuda porque muitas vezes já não sabia exactamente em que contexto tinham aparecido aqueles personagens nos volumes anteriores, mas mesmo assim estive envolvida do principio ao fim.

Aconselho a todos os fãs de Neil Gaiman, de banda desenhada, bonitas histórias e todos aqueles que não têm medo de sonhar.

E com este livro, estou mais perto do objectivo no Goodreads.

Goodreads Review

The Kindly Ones
Daqui

Sandman, A Tempestade dos Sonhos

Sandman_Worlds End

Parece-me apropriado depois de ler os livros do Sandman Slim, voltar ao Sandman original, o senhor dos sonhos, neste que é o oitavo volume da sua colecção de histórias.

Desta vez seguimos Brant Tucker que se perde numa tempestade e vai ter a uma estalagem em World’s End, onde fica preso, junto com muitos outros comensais, e todos se entretêm a partilhar histórias para passar o tempo até que passe a tempestade e possam retomar a sua viagem. Sendo isto contado por Neil Gaiman, conseguimos facilmente imaginar que cada personagem habita uma linha temporal diferente, e mesmo uma realidade muito diversa. Para intensificar essa percepção, cada conto foi ilustrado por um conjunto de artistas diferente, por isso difere também no estilo em que nos é apresentado.

Eu sou uma fã incondicional de Sandman, como já devem ter reparado, mas acho sinceramente que à medida que caminhamos para o final destes volumes as histórias vão ganhando mais consistência e maturidade, as referências a outros imaginários literários e mitológicos multiplicam-se e enriquecem a história, e com certeza que eu nem as consegui abarcar todas. O facto de ter utilizado ilustradores diferentes deu imenso caracter a esta compilação, e veio dar-lhe uma coerência quase paradoxal.

O final deste livro é também dos mais poderosos que já li até agora em toda a saga do deus dos sonhos. Depois de todos terem contado as suas histórias (as minhas favoritas foram as duas primeiras), todos os que estão presos na estalagem assistem à passagem dum cortejo fúnebre no céu, imponente, com figuras gigantes no meio das estrelas. A encabeçá-lo vemos o Destino (como se nos mostrasse que no final de tudo é ele que nos rege) e a fechá-lo vêm as irmãs Desejo e Morte. Todos os Endless estão presentes menos o nosso protagonista, por isso não nos é difícil adivinhar qual a causa do cortejo, e, consequentemente, o que causou a tempestade. A solenidade imprimida à cena, e a maneira como tudo nos é mostrado e não contado, deixou-me com um aperto no estômago, como se de um amigo se tratasse.

Gostava também de deixar aqui uma nota para a introdução que foi feita por Stephen King. Nestes livros as introduções são quase sempre muito longas, e pecam muitas vezes por serem demasiado explicativas e quase anteverem toda a trama que se vai seguir. Por várias vezes que as abandonei para ler apenas no final, ou nem isso porque não tive paciência. Mas esta introdução revela que Stephen King é um grande escritor, mesmo numa tarefa tão simples como fazer uma abertura para um outro livro. Sem revelar nada que não deva ser revelado, ele aguça-nos a curiosidade e espicaça-nos a vontade de ler o mais rapidamente possível aquilo que temos nas mãos, chamando subtilmente a atenção para pormenores que poderiam passar despercebidos. Gostei muito.

Como sempre, recomendo a todos os que gostam de banda desenhada, mitologia, boas histórias e boa literatura em geral. Deixo-vos com um cheirinho.

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De Volta ao Sandman

Neil Gaiman - Brief Lives

Demorou um pouco mais de um ano para, por razões várias, eu conseguir retomar a leitura dos livros do Sandman. Mas creio que valeu bem a espera, porque me parece que tive em mãos o meu volume favorito de toda a saga. O senhor dos Sonhos depois dum desgosto amoroso vai partir numa demanda com a sua irmã Delírio, em busca dum irmão há muito desaparecido na Terra, Destruição.

E, ao longo de belíssimas páginas, vamos conhecendo melhor a familia de Morfeu com as suas dificuldades, bem como a disposição mais depressiva do senhor dos Sonhos. O que é mais interessante nestes livros do Neil Gaiman, em que podemos achar que o visual até já está um pouco datado, são os textos muito bem construídos e que nos convidam sempre a uma profunda reflexão. Neste volume vamos sendo conduzidos por pinceladas sobre a inevitabilidade do Destino, a brevidade da vida, por mais longa que nos possa parecer em anos. No limite, nem 15 mil anos pareceria uma longa vida quando somos confrontados com a iminência da morte. É fabuloso como um “simples” livro de comics pode conter em si tantos mundos.

Para quem gosta de fantasia a sério, mundos paralelos, mitos, lendas e deuses antigos, este autor será sempre uma fonte de inspiração e conhecimento. Mal posso esperar para ler os próximos.

Fiquem com um amuse bouche.

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Mitos do Norte

Norse Mythology

American Gods é uma série que está mesmo quase a estrear (dizem que dia 30 de Abril num canal de cabo americano), e só isso já seria razão suficiente para pegar num livro do Neil Gaiman (outro, para além do Sandman que tenho andado a ler por aqui). Claro que a escolha óbvia seria o homónimo, mas não consegui resistir a este Norse Mythology, acabadinho de sair, que ainda por cima vem complementar lindamente a outra série que ando a acompanhar, Vikings.

Foi por essa razão que os nomes dos deuses e deusas estavam frescos na minha memória, e isso ajudou muito a relacionar as histórias e os mitos. A mitologia nórdica, apesar de grandemente perdida no tempo, é muito rica em personagens e histórias, e talvez seja essa a razão que me levou a achar este um dos livros mais fracos do autor. Normalmente, ele costuma deslumbrar-nos com a riqueza das suas personagens, o envolvimento das suas narrativas, ao ponto de nos sentirmos parte do mundo fantástico que ele criou para nós em cada livro. Neste o começo foi um pouco confuso, como se o autor tivesse de condensar muita informação logo de início para conseguirmos abarcar o mundo todo, mas à medida que íamos progredindo nos contos, o génio contador de histórias de Neil Gaiman ia vindo progressivamente ao de cima. No entanto, nunca me consegui sentir verdadeiramente envolvida no mundo e nas descrições, sempre me senti como se fossem apenas contos avulsos, mal ataviados uns aos outros, sem continuidade, sem aquela sensação de saga que eu estava à espera.

No final de tudo, o meu conto preferido foi o Ragnarok, ou a descrição do final dos tempos e o seu renascimento, que é suposto encher-nos de temos e esperança ao mesmo tempo, e que deixa no ar a questão se já terá ou não sucedido com o final da era desses personagens distantes.

Ler este livro despertou-me a vontade de voltar a ouvir os velhinhos Amorphis, uma banda finlandesa cujos primeiros álbuns eram inspirados na Kalevala, um poema épico finlandês fundamental no desenvolvimento da identidade deste povo, pleno de histórias, mitologia e sagas. Um cheirinho aqui.

E pronto, a caminho do próximo livro, que espero me entusiasme mais.

Goodreads Review

 

Sonhos no Publico

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Já referi várias vezes este ano que estou a reler a colecção do Sandman do Neil Gaiman, graças a uma amiga que a está a reconstruir na versão original. Tem sido um processo saboreado e que me tem transportado a um passado não muito longinquo onde a vida era possibilidades e promessas.

A partir de hoje e durante 11 semanas o Publico oferece-nos a possibilidade de ter esta colecção nas nossas casas, versão portuguesa. Tivesse eu mais espaço em casa para uma biblioteca como deve ser e não hesitava.

Boas leituras.

 

To Sleep, perchance to Dream

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Há mais anos do que aqueles que eu gosto de me lembrar, uma colega de faculdade introduzia-me no fabuloso mundo dos Joy Division e dos livros do Sandman. Foi uma emotion overload, e o meu coração povoado de hormonas, angústia existencial e excesso de horas de estudo conseguiu apenas devotar-se militantemente à música gótica, destino que carrego até hoje de forma mais ou menos evoluida.

O Sandman acabei por ler na Fnac, quase todos os volumes, mas de passagem e sempre com a promessa de voltar. Este ano é o ano do sonho novamente. Por intermédio de outra amiga tenho-me reencontrado com o regente dos sonhos, devagarinho, e temos redescoberto a nossa relação.

Já li os três primeiros volumes, e espero acabar 2016 com os 10 volumes terminados. A delicadeza dos desenhos acentua a crueza das histórias, já que o Neil Gaiman nunca tem pudor em espicaçar a nossa mente e testar os nossos limites.

Verdadeiramente, banda desenhada não é uma coisa de crianças. Pelo menos a que é feita a sério, com mensagem e a expandir os limites da criatividade e realidade.

Quem quiser saber um resumo pode encontrá-lo aqui

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