Este fim de semana literalmente tropeçamos no novo trabalho do Marco Martins, Provisional Figures, que estava em cena no Maria Matos e achámos que não podíamos perder. Primeiro porque ele encenou a peça Actores, de que eu falei aqui, e que gostei tanto.
Depois porque vinha num ciclo de reflexão sobre as migrações e a sinopse parecia muito interessante.
E por fim porque é a despedida do Maria Matos enquanto teatro municipal, por isso dificilmente se verão coisas de cariz tão experimental e alternativo naquele espaço novamente. Costuma dizer-se que temos aquilo que merecemos (votamos, etc). O Peixinho não se mete em politiquices, mas mais uma vez acho triste que andemos demasiado ocupados com outros escândalos no bairro de Alvalade, que não dignificam ninguém, e isso retire todo e qualquer tempo de antena a notícias mais relevantes e que essas sim têm influência verdadeira na vida das pessoas. Nomeadamente, que um espaço que se dedicava a um género de teatro mais experimental e que era de todos, vá deixar de ser municipal, para passar a ser mais um sítio de teatro comercial, mais fácil de digerir, com menos que pensar. Mas, suponho que seja isso que vende, e que dá bilheteira, e dando continuidade ao que disse acima, também temos o teatro que merecemos, ou fazemos por merecer. Podem ler aqui o manifesto.
Mas, voltando à vaca fria, ou neste caso ao magnífico espectáculo do Marco Martins, não viemos de lá desiludidos. Uma reflexão sobre as migrações, assunto mais que actual, mas sem cair nos clichés que se esperaria, esta performance é algo intermédio entre uma peça de teatro, um documentário e um espectaculo de dança, tudo feito com pessoas reais, a contar as suas histórias de vida. Não são actores, são ingleses que vivem na vila britânica de Great Yarmouth, ou portugueses que imigraram para trabalhar nas fábricas das redondezas e viver nos grandes hotéis agora decadentes pela falta de turistas, e um esloveno também imigrante. São pessoas como nós a contar a sua história, o impacto da crise económica nas suas vidas, os dois lados da moeda.
Se quiserem ler mais sobre o processo criativo, podem ler uma entrevista com o encenador aqui.
Tudo isto com uma belíssima banda sonora, um palco muito especial, e uma envolvência do público como nunca tinha sentido. Adorei cada uma daquelas personagens, senti as suas histórias, foram minhas durante aquelas duas horas, fiz parte do espectáculo com elas.
Teatro com T grande, uma despedida fenomenal para o Maria Matos. Terminou dia 4, mas se aparecer novamente por aí, não deixem escapar. Vale muito, muito a pena. E ainda podem sair de lá com uma receita fenomenal de peru, como eu, embora duvido que fiquem com vontade de voltar a comer perú nos tempos mais próximos.